Por Joana Reichert
Iporã do Oeste – A doação de órgãos é um assunto que ainda gera muito tabu na sociedade. Mas, considerando as estatísticas, é algo que precisa ser conversado e que deve ficar muito claro tanto para quem quer ser doador, como para a família que é a única que pode autorizar a doação. Hoje no Brasil, mais de 50 mil pessoas aguardam por um transplante. Dessa forma, cada vez que uma família autoriza a doação de órgãos, faz com que de alguma forma a vida continue.
Quem já esteve na fila, aguardando um doador compatível, sabe o quanto essa espera é angustiante. O Ronivan Trantenmüller ficou por quase cinco anos esperando o transplante de um rim, para que a partir disso, pudesse novamente levar uma vida normal. Quando tinha apenas 22 anos de idade, Ronivan começou a sentir muita dor nas costas e inchaço, o que o levou a perder a função renal. Seus rins também eram de um tamanho menor ao normal, por não terem se desenvolvido corretamente. Quando descobriu o problema, já estava em um ponto crítico e a solução foi iniciar a hemodiálise. Por quatro anos e meio realizava hemodiálise três vezes na semana e sessões que duravam cada uma quatro horas. Fez também os exames com a esperança de encontrar um doador compatível e conseguir fazer o transplante de rim. Ao descobrir a doença, Ronivan morava e trabalhava em Brasília e retornou para a cidade de sua família, Guaraciaba, para realizar o tratamento.
Em abril deste ano, completaram-se 19 anos do transplante. Ronivan realizou o procedimento em Chapecó, e após passou por um ano de cuidados intensivos. Na época já residia em Iporã do Oeste. Por conta do transplante, teve que se adaptar a uma nova rotina com uma alimentação baixa em sal e gordura, consumo reduzido de bebidas alcoólicas, e evitar quedas e pancadas. Ronivan leva uma vida normal, em família, no trabalho, nas atividades de lazer, sempre mantendo os cuidados necessários. Também faz uso de medicação que evita a rejeição do rim pelo organismo e há cada 60 dias realiza exames de acompanhamento.
Como receptor, Ronivan tem o desejo de saber quem foi o doador do seu rim, mas até o momento isso não foi possível. Atualmente a doação de órgãos pode ser feita de duas formas: uma que é o sistema fechado, em que a família opta por não divulgar as informações do doador; e o sistema aberto em que é divulgado endereço e contato da família do doador. Como Ronivan recebeu o órgão pelo sistema fechado, não tem informações de quem foi o doador.
“Se pudesse deixar uma mensagem, eu diria o seguinte: doem órgãos, sejam doadores. Nenhum órgão será retirado de uma pessoa sem que tenha a comprovação médica através de vários exames que houve a morte cerebral. As pessoas que têm a vontade de serem doadoras, devem deixar isso claro para os seus familiares. Esse assunto precisa ser falado, pois é a família que precisa autorizar a doação. As vezes as pessoas não veem essa importância, mas para quem está na agonia de fazer a hemodiálise e esperando por um transplante, é algo muito difícil”, enaltece Ronivan.
Do receptor para o doador
Se para quem está na fila aguardando um doador compatível é uma grande angústia, a decisão de doar o órgão de um familiar também é extremamente difícil e dolorida. Foi essa decisão que a família de Valesca e Délcio Cass teve que tomar há 16 anos, quando o filho do casal, Francis, faleceu após sofrer um acidente de moto na SC 163, na Linha Campinas, Descanso. Ele tinha 24 anos de idade, e apesar da decisão difícil de doar seus órgãos, esse era um desejo que Francis sempre expressava a família quando em vida.

A mãe Valesca explica que após o acidente Francis foi levado para o hospital de Joaçaba, onde havia vaga na UTI. Após alguns dias internado, e com a confirmação da morte cerebral, a família foi consultada sobre a possibilidade da doação dos órgãos. Na hora, Valesca recorda que não queria autorizar, pois a esperança era que seu filho reagisse e pudesse continuar vivo. Francis era doador de sangue, e por várias vezes disse aos pais Valesca e Délcio, e a irmã Bruna, que se um dia acontecesse algo, e desse tempo, queria que seus órgãos fossem doados para ajudar outras pessoas.
A família fez a vontade do filho e irmão, e autorizou a doação. Antes disso, uma bateria de exames, em vários horários diferentes, confirmou a morte cerebral. Francis só respirava pela ajuda dos aparelhos. Valesca afirma que foi uma decisão muito difícil, mas hoje tem clareza de que foi o melhor, pois várias pessoas continuam a viver graças aos órgãos do seu filho, que era muito saudável e forte.

Hoje em dia, Valesca mantém contato com uma das receptoras que recebeu o pâncreas do seu filho. É uma mulher de Belo Horizonte que troca mensagens com a família, e considera Valesca e Délcio como seus pais, e Bruna como irmã. Esta receptora demonstra uma gratidão enorme ao gesto da família, que possibilitou a ela continuar vivendo, pois tinha um problema grave de saúde antes de realizar o transplante. “De alguma forma nosso filho continua vivo, ele está por aí. O coração dele bate em algum lugar. As pessoas precisam se conscientizar da importância da doação dos órgãos como algo que possibilita a outras continuarem vivendo, finaliza Valesca.
Como se tornar doador de órgãos
Hoje, no Brasil, para ser doador não é necessário deixar nada por escrito, em nenhum documento. Basta comunicar a família do desejo da doação, que só acontece após autorização familiar.
Além da doação de órgãos após a comprovação da morte cerebral, também é possível ser doador vivo e doar um dos rins, parte do fígado, parte da medula óssea e parte do pulmão. Pela lei, parentes até quarto grau e cônjuges podem ser doadores; não parentes, somente com autorização judicial.
Os órgãos doados vão para pacientes que necessitam de um transplante e estão aguardando em lista única, definida pela Central de Transplantes da Secretaria de Saúde de cada Estado e controlada pelo Ministério Público

